Instinto

Um depilador profissional, que conhece do riscado, indicou a cera comum, feita de açúcar com vinagre. Comprou os ingredientes. Quando chegou em casa, a esposa já tava no quarto. De pé, descalça. Além da calcinha, sutiã e batom vermelho na boca. Suzane queria ativar a libido do marido. Desmotivado faz tempo, Cícero gosta é de homem. Pelado, escondido da família e amigos, trai a mulher com o vizinho. Seguiu o instinto que reprimia. Mal casado e indeciso, transou com o cara e achou maneiro. Desde então enfrenta dificuldades pra comer a cônjuge. Diz que a foda é muito chata. Ou ela senta de frente ou de costas. Se não é isso, levantam juntos, deitam ou alternam a velocidade de penetração. Só fazem oral, vaginal e anal feminino.

Trama

Pra esquecer a dúvida recorrente, meteu uma fita no buraco do vídeo. Rebobinou. A trilha sonora de bom gosto atraiu tanto a atenção de Roni que, quando foi ver, já tinha perdido um pedaço. Voltou de novo. O começo do filme demorou a ser compreendido pelo rapaz desatento. Dentre as opções disponíveis, pensou na comida que vende lá embaixo, numa rua sujeita à travessia de pedestres. Pisada. Viajou pela primeira vez. Deu asas à imaginação e parou de encucar com as possibilidades. Botou rew e depois play. Na hora da primeira conversa, botou stop pra fazer um cigarro. Levantou da cama, acendeu a luz, pegou uma folha de papel fino e colocou a planta, já tratada, dentro. Executou o procedimento conhecido como apertar e acendeu. Por considerar esta a melhor atividade a ser realizada, acionou o longa outra vez. A trama agradou Roni. Baseada em fatos reais, mostra o sofrimento de um grupo de pessoas escondidas que vivem em silêncio.

Pingo

Um pingo de chuva caiu do céu e bateu no chão de terra. No caminho, sem saber pra onde ia, puxou assunto com o desconhecido ao lado. O papo teve quatro fases: apresentações, cumprimento, pergunta e silêncio. Meu nome é Charles. Prazer, Danilo. Aperto de mãos. Quer um? Morte. Da vida curta, foi a única história. Contaram cada detalhe quando passaram pelo purgatório. A câmera, instalada no teto da sala, captou o momento. Cabeças baixas, aflição e medo. Sentado na cadeira atrás da mesa, o senhor barbudo reprovou a postura tímida da dupla. Propôs um desafio: caso superassem, subiriam. Soprou o apito sagrado pra começar e acabar com a prova. Os espíritos, livres dos corpos e condenados pelo juiz, pairam no ar.

Fluxo

Anselmo pediu licença com educação. Gonçalves é maluco. Pensa e age de maneira não convencional. Desta vez foi tranqüilo: compreendeu a solicitação, demonstrou boa vontade e moveu o corpo pra direita. Um dia antes, de frente pro espelho, tirou meleca com o dedo médio. Falou sozinho sobre a chuva. A intensidade depende do tamanho e da pressa de cada pingo, que, incapaz de mudar de trajetória, segue o fluxo. Viu um carro parado na rua, rente à calçada. Disse que Jó e Abraão, homônimos de exemplos bíblicos de fé, sentaram nos bancos do volante e do carona, respectivamente. O motorista acertou o jogo, saiu da vaga e pisou no acelerador. Passou a segunda e, de maneira seqüencial, chegou na quinta. Isso em linha reta, direção contrária à parede de concreto. Desviou após reduzir a marcha e manteve o controle do veículo até estacionar de novo.

Sozinho

Diego almoça sozinho. O pessoal estranha, mas, como ninguém faz questão da companhia, pararam até de convidar. Na primeira vez, disse que tava sem fome e que iria depois. Na segunda, com um discurso pouco convincente, falou que tinha um problema pra resolver e que só dava tempo de fazer um lanche ali por perto. Tudo bem, que seja assim. Tá bom pra todo mundo. O cara, à vontade, fica na dele e vai pra onde quer. Os outros, livres da presença, interagem da maneira esperada. É o encaixe ideal entre as personalidades do grupo e do indivíduo isolado. Na semana passada, durante o período destinado à refeição principal, se encontraram no meio da rua. A galera vinha do restaurante de sempre. Diego, suado, saía de um prédio comercial onde funcionam, em andares distintos, um puteiro e uma pensão.