Dança

Um sorriso. Só um. Sorriso dela. Sorriso dos sonhos que sorriu pra mim. De mãos dadas, durante a dança. Parece mesmo um raio, o nascer e o pôr do sol. Eu mesmo, admirado, sorri. Meu melhor sorriso. Pra ela.

Fábrica

Metido com venda de bala, morreu cedo. Vinte anos. Foi na fábrica, pegou o carregamento e, já em casa, separou em potes. Depois do almoço. Amigos, professores e seguranças. Senhoras de idade. Elogiado pela cordialidade e discrição, foi alvejado na esquina de sempre. Ponto conhecido. Os tiros, em diferentes partes do corpo, provocaram o óbito imediato. Assassino, vítima e testemunhas. Silêncio.

Surpresa

Quase morreu. Quase. Vinha de moto. Velocidade baixa, pouca atenção e surpresa. Mandaram parar. Desligar, descer e entregar. Ficou nervoso. Mandaram alguém atirar. Ouviu o que disseram. Aos berros. Carteira, pulseira e celular. Um soco. Dois chutes. Caído e sujo, ouviu o que disseram. Saíram. Ficou sozinho. Doído. Vivo, sente o gosto. Não volta atrás. Nada que apague.

Gastrite

Na primeira varredura, inchaço no pâncreas. Corrigido. Febre, dor de dente e torcicolo. De uma vez só. Um comprimido. Ficou bem. Anos depois, precisou de mais. Conjuntivite e cólica. Cegueira noturna. Dos dez que ganhou, sobraram três. Ficou com medo e, por isso, passou a poupar. Passou pela afta e pela gastrite. Fez uso de medicações convencionais. O primeiro dos últimos, incômodo na lombar. Curada. Veio a queda. Resistiu. Passou pomada comum. Sífilis e labirintite. Frasco vazio. Não tinha mais nada.

Dia

Naquele dia, era o que mais queria. Não veio. Agora veio. Passou do lado, solícito. Deixou que fosse. Naquele dia, pedia. Sofria. Era o que mais queria naquele dia. Hoje viu de frente. Disponível. Deixou que fosse. Naquele dia, não deixaria. Gritaria. Era, naquele dia, o que mais queria.