Livro

Comprou uma cafeteira. E pó. Com medo de ficar viciado, quase desistiu. Adquiriu porque priorizou o efeito. Imagina que, do jeito que é, vai controlar. Na média, três por dia. Se quiser mais, consome. Menos, ignora. É educado, magro e prefere comida pesada. Angu, rabada, bucho e mocotó. Come o quanto pode. Nascido em um e criado em diferentes municípios, cresceu. Desenvolveu raciocínios acerca de temas. Teve problemas com um. O que fazer, na maioria dos dias, pra amenizar a pressão negativa imposta pela sobrevivência. Leu o livro de um cara morto. Refletiu, concordou e piorou. Existência desnecessária. Acordou cansado, desmotivado e desgostoso. Tarefas a cumprir. De repente, pânico. Procurou, no contexto, respostas. Repetiu a pergunta. Foi na cozinha, passou um café e voltou pra sala. Próximo de um colapso, em meio ao desespero, ouviu o cérebro. Frase simples, direta. Bomba na cabeça.

Cortina

O animal abatido, triste, recebeu conselhos. Dicas, exemplos e atenção. Café na cama e elogios. Bombons na caixa, flores e cartões. Ganhou beijos e abraços. Ouviu recados e absorveu sentimentos. Após cumprimentos, foram embora. Não saiu do lugar. Botou um filme e desistiu. Música também. Tentou ler. Parou. Palavras cruzadas, vídeos e fotos. No silêncio, solidão. Naquele espaço. Não comeu o que trouxeram. Bebeu água e, desatento ao ato, olhou pela janela. Levantou. Fechou a cortina, virou de lado e ficou de frente. Deu tempo pro espelho. Recapitulou. Passo a passo de um drama que, de tão recente, não sai da cabeça.

Verde

Em meio às linhas, recados. Mensagens subliminares. Segundas intenções, indiretas e subentendidos. Fundos de verdade. As construções, elaboradas em prol da finalidade, dão a entender. Perguntas típicas. Ausência de legítimo interesse pelo tema. Insinuam. Fazem alusões, menções e referências. Acumulam indícios. A idéia, de não deixar claro, impede a exposição explícita. Sobram sutilezas. Comentários evasivos, banalidades e desejos contidos. Sujeitos à rejeição, jogam verde.

Bancada

O passeio matinal pela floresta encantada levou o cavaleiro à morte. Vinha devagar, solidário ao ritmo do eqüino. Tomou um tiro fantástico na cabeça. O projétil, disparado pelo feiticeiro, congelou o cérebro e estourou. Fez a bala em casa. Tem uma bancada de madeira, recipientes e poções mágicas. Pra imprensa aliada, disse que não matou. Mas tem um vídeo. Filmado pela artesã desacordada. Em alta definição, deixa clara a autoria. A guarda local encoberta. Foi Alberto, governante absoluto, que combinou com o mago. Deu moedas de ouro pra que comprasse ingredientes.