Canga

Na cadeira de praia, regulável, sentou de biquíni. Cor de abóbora. Passou protetor nas pernas, na barriga e na parte exposta dos peitos. Após duas borrifadas, aplicou o produto no pescoço e no rosto. Faltavam costas e bunda. Levantou, resolveu a questão das nádegas e uma parte do dorso, inacessível às próprias mãos, ficou desprotegida. Deitou de bruços na canga rosa. Dormiu meia hora. Espreguiçou, bocejou, tomou coragem e foi pro mar. Superou o efeito da água gelada nos pés. De frente pro horizonte, afundou a cabeça. Deu cambalhota, pegou jacaré e nadou cachorrinho. Subiu e desceu no embalo das ondas cheias. Furou as fortes e mergulhou na calmaria. Saiu quando bastou.

Ardósia

As pedras, por incrível que pareça, boiaram. Arthur que jogou. À beira do rio, distraído e descansado, esperava pelo comportamento padrão. Tacou outra pra confirmar. Intrigado, procurou rochas de tamanho, composição e densidades diferentes. Todas flutuaram. Pra entender, começou a estudar. Comprou livros e equipamentos. Entrou pra ver de perto. Pouco versado em natação de água doce, afundava e reagia. Fazia esforço pra não morrer. Pegou com a mão, observou com calma e confirmou a tese. Era aquilo mesmo. Chamou a esposa. Depois filha, amigos e conhecidos. Na superfície, já coberta de quartzos, esmeraldas e diamantes, não tinha ouro. Primeiro teste. Diante dos presentes, arremessou a pepita. Passou um tempo no ar, quicou e parou entre o mármore e a ardósia.

Frio

O jambo no pé, pendurado, não caiu a tempo de ser comido pela menina. Ficou triste. Dentre as opções, escolheria Gabriela. Quem deglutiu foi Luciana. Nessa hora, o fruto quis ficar preso na árvore. Olhava pra baixo com medo de não aguentar. Suou frio. Sem forças, maduro demais, acabou onde temia. A garota faminta mordeu com vontade. Sugou o suco. Até o fim, mastigou. Sobraram o caroço com as sementes e o talo. Como sempre, cresceu de novo. Desceria por Giovana. Mulher inteligente, simpática, bonita e gostosa. Caminhava sorridente pelo pomar. Em outra época, entraria no clima. Faria esforço pra sofrer a queda. Mas tá desanimado. Descobriu que, apesar do impulso, não tem autonomia pra despencar.

Mochila

Pra não gastar tempo útil, fez a barba no trabalho. Desceu a escada, atravessou o corredor e entrou no banheiro. Fechou a porta. Espalhou sabão no rosto e, com a navalha afiada, cortou os pelos. Subiu tranquilo e sentou na cadeira. Viu o e-mail pessoal, pagou as contas de casa e ligou pra um amigo. Levantou e foi na área de lazer pra ter privacidade. Na volta, passou na copa pra tomar café. Bebeu com calma. Chegou na sala, brincou com os colegas e comeu um biscoito. Prestes a trocar de carro, procurou anúncios no jornal. Selecionou alguns, cortou com a tesoura e guardou na mochila. Quando parou pra jogar cartas no computador, percebeu o papel colado na tela. Um cliente, nervoso, queria respostas. Encaminhou o guia do usuário e se colocou à disposição pra ajudar no que fosse possível.