Culpa

Atenta ao chão, voa. Pra cima e pra baixo. Bate forte a asa presa ao corpo. Tem pressa, culpa e medo. Entre nuvens, viaja. Passa frio, morno e quente. Rasante. Quase morte. Enxerga, no asfalto, o fim. Escapa. Sobe. Descansa.

Alarme

Além do mais, o alicate. Tirou meu sono. Levou minha força, meu sangue e choro. Ainda caem. Tudo revirado. Papéis e roupas. TV. Do dinheiro, moedas. Alarme cortado. O barulho e a cena, o cenário, na cabeça. Invasão. Fuga pelo telhado. Tentativa, frustrada, de evitar. Vazio. Insone e incrédulo, destemido, delegacia. Desolado. Madrugada. Relato, registro e assinatura. Ironia e descaso. Procedimento padrão. Na perícia, coação. Pegou meu chocolate. Ladrão safado.

Cabeça

Só pensa. Não verbaliza. O que passa pela cabeça, sobre livros, fica guardado. Filmes e conversas. Deixa quieto o que escuta. Linhas completas de raciocínio. Opiniões formadas. Não defende, não se defende e não acusa. Quando insistem, ignora. Não quer saber. Chamam de estranho. Dizem que é mudo. Dizem que é discreto. Dizem que, por falta do que falar, silencia. Dizem isso.

Mercado

Faz aos poucos. Elabora, no tempo que sobra, pedaços. Apaga. Materializa o que pensa em fragmentos construídos em intervalos irregulares. No quarto vazio, quieto. Ônibus e mercado. É um presente que aparece. Que procura. Lapida o que é bruto e, depois de pronto, entrega.